terça-feira, 29 de novembro de 2011

Sensacionalismo, segurança e ética; Uma reflexão sobre a morte de um profissional.



O cinegrafista Gelson Domingos da Silva, que capturava imagens para a Band, morreu após ser atingido por um tiro de fuzil, que atravessou um colete a prova de balas e o seu tórax, enquanto cobria uma ação policial na favela de Antares, zona oeste do Rio de Janeiro, no dia 6 de dezembro de 2011.

Acostumados a ver cenas de violência no noticiário, muitas vezes não nos perguntamos como aquelas imagens são obtidas, apenas assistimos hipnoticamente às operações, que saciam nossa curiosidade mórbida de ver a mesma ação de filmes como Tropa de Elite, misturados com o drama da vida real. Esquecemos-nos que existem pessoas verdadeiras ali, correndo risco. Queremos acreditar que mudando de canal estamos seguros, que tudo aquilo pode ser esquecido no dia seguinte.

Contudo, também nos esquecemos que essa mesma curiosidade, que naturalmente sentimos, é o que faz a maquina de dinheiro da imprensa girar. Podemos tentar nos enganar, dizendo que Gelson estava ali apenas por que, como diz seu próprio irmão, ele “amava a profissão”. Não contestamos a veracidade disso, ele provavelmente devia amar o trabalho que tinha, para se expor a esse risco, mas podemos considerar que toda a culpa é dele, por ter ido a um lugar que não devia ir?

Compartilhamos da visão de Luiz Andrioli, em seu artigo “A Reportagem Encurralada”, quando diz que o cinegrafista foi vitima de um tipo de jornalismo sensacionalista que nós mesmos criamos e consumimos. Andrioli defende a idéia que nosso “gosto médio” pela violência pautou aquela reportagem, que acabou por levar Gerson ao lugar errado. Esquecemos-nos da amplitude do problema que é a violência, e que o papel da mídia é o de cobrar soluções, promovendo debates, análises e o questionamento. Isso não virá no meio de um fogo cruzado entre a polícia e as milícias.

Não pretendemos fazer juízos de valores, mas nos sentimos a vontade para expressar nossa opinião em um espaço de debate como esse. Entendemos que existe essa espetacularização da violência, e que o “sensacional” atrai o público, e é exatamente essa impressão que o programa “Brasil Urgente – Edição Rio”, para o qual Gerson trabalhava nos deixou. Inclusive postamos aqui um vídeo com a abertura do programa, para que o leitor tire sua própria conclusão.


O código de ética dos jornalistas, expressa claramente no capítulo II, artigo 6, inciso VI, que a conduta profissional do jornalista não deve colocar em riso a segurança das fontes ou dos profissionais com quem trabalha. Também expressa no capítulo III, artigo 11, inciso II, que é responsabilidade do profissional , não divulgar informações de caráter mórbido e sensacionalista. Por último citamos no capítulo I, o artigo 2, inciso II, que fala que o direito à informação deve ter por finalidade o interesse público.

Contudo não é tão simples refletir sobre o caso. A linha que separa o que é de interesse publico e o que é sensacionalista, é tênue e vai variar de acordo com quem analisa o caso. Voltamos a Andrioli, para dizer que concordamos com ele quando diz que o dever do jornalista não é o de mostrar a violência, e sim de cobrar soluções e propor debates. A Band divulgou as imagens que o cinegrafista capturava na hora, e nossa opinião é que ela atendia mais a uma exigência editorial por audiência do que compor um quadro para exposição e reflexão sobre a violência.

Entendemos que é extremamente importante que se tenha a “testemunha ocular” no campo, pois caso contrário muitas coisas seriam “empurradas para baixo do tapete”, por isso trazemos a reflexão de Sylvia Moretzsohn para esse artigo, quando ela diz que “resta saber como cobrir os acontecimentos sem ceder à lógica da espetacularização e, mais ainda, sem estar a reboque da polícia, quando esses acontecimentos são confrontos armados entre policiais e traficantes.

Portanto a nossa critica não é dirigida aos profissionais que se arriscam para trazer informações de qualidade para o nosso noticiário. Ela é dirigida para aqueles que transformam a informação e o conhecimento em mercadoria, colocando a audiência acima de tudo.


Francisco Vorcaro e Andréia Basdão

Um comentário:

  1. Prezados Francisco e Andrea,
    Assunto bem pautado. Discussão sobre interesse público e o difuso conceito de sensacionalismo, já que praticamente se incorpora ao próprio conceito de notícia quando ela é considerada exclusivamente como mercadoria. Essa é uma das questões que mostram a limitação desse recorte (mercadológico) para entender o conceito de notícia.
    Algumas observações: por favor, há uma ilustração no blog que precisa ser identificada ou retirada, para sermos coerentes e observarmos as discussões sobre autoria que tivemos em sala de aula. Avalie, a luz das nossas discussões, como tratar essa questão da ilustração.
    Abraços,

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