terça-feira, 19 de junho de 2012

Radio Favela- Resistência dos barracos para mundo



Logo da radio
                                             Por Lais Seixas e Julia Falconi
Há mais de 30 anos no ar, superando os momentos de dificuldade, a sobrevivência da rádio Favela Fm mostra, cada vez mais, aos moradores a sua resistência e divulga a cultura da comunidade aos espectadores.


Belo Horizonte, uma capital que tem seu fluxo através da cultura, lazer, entretenimento e seu jeito mineirinho de ser tem também um longo histórico de marcos civis muito interessantes e se esconde em sua ideologia mais humilde. Na região metropolitana vive o Aglomerado da Serra, classificado como a segunda maior comunidade do Brasil, possui uma divisão em oito vilas. Estima-se que cerca de 160 mil pessoas habitam a comunidade. A partir de uma entidade comunitária, Associação Cultural de Comunicação Comunitária Favela FM, o local ganhou uma voz e uma nova estrutura de lazer e entretenimento. A Rádio Favela, sintonizada no canal 106,7 proporcionou uma voz e uma vida ao Aglomerado, e desde sua origem, a "voz do morro" partiu para as ruas da comunidade.
A Rádio começou a operar em 1981 em condições precárias: transmissor à bateria, toca discos à pilha (a energia elétrica ainda não havia abrangido o local da comunidade), e equipamentos que quem manuseava teria que driblar, inovar e improvisar. A rádio foi fundada voluntariamente pelos moradores da vila Nossa Senhora de Fátima (uma das oito que estruturam o Aglomerado), com intuito de criar um espaço de cunho educativo, musical e cultural, a fim de divulgar a música e cultura negra, conscientizar os jovens do     Aglomerado em relação aos problemas com drogas e violência e se manifestarem contra a discriminação aos moradores da favela.

Tarcísio Mauro Vago e Wemerson de Amorim,
 apresentam programa semanal na Rádio Favela
O sistema de monopólio da radiodifusão vigente no país sempre foi o maior obstáculo às atividades da Rádio Favela, assim como a todas as iniciativas populares no campo da comunicação de massa. Com isso a rádio inicialmente foi ao ar de forma ilegal e, devido a uma forte repressão que ocorria na época no país, teve de viver "às escuras". A "voz" da comunidade era transportada frequentemente pela favela, indo de barraco em barraco e ampliando, cada vez mais, o número de pessoas com ela envolvidas. Embora o funcionamento da Favela FM tenha sido marcado por interrupções politicas e perseguições policiais, a rádio resistiu e permaneceu no ar. A Favela FM se legalizou 15 anos após sua origem e hoje é filiada à Amarc Brasil (Associação Mundial de Rádios Comunitárias).
A Favela FM conquistou um público curioso e espectadores animados com a novidade local, hoje, o alvo são os jovens de 10 anos à adultos de aproximadamente 50, a maioria são do sexo feminino e pessoas da classe B e C. Assim como a rádio, os programas são comunitários, a interação é mutua e a receptividade é grande, os espectadores, principalmente os moradores da comunidade, participam e opinam, não só através de telefonemas durante a programação mas, também, ao entrar pelo portão da própria rádio para participar ao lado do locutor. "A programação da rádio é a extensão da conversa do povo na rua... é a amplificação do bate-papo", explica um dos fundadores da Rádio e seu atual diretor-presidente, Misael Avelino dos Santos, 42 anos.
Hoje em dia o conceito da rádio é tão grande que já se tornou mundialmente conhecida e vem ganhando muito reconhecimento dos seus ouvintes, dentre tantos reconhecimentos, o maior, um prêmio da ONU (Organização das Nações Unidas) que foi outorgado ao presidente da Favela FM, Misael, Derimar e seus companheiros de luta pelo trabalho contra a disseminação de drogas, a prostituição e a todos os tipos de problemas que se abate aos moradores do Aglomerado da Serra.
Aglomerado da Serra, onde está localizada a Radio Favela

A dona de casa, Marilda Andrade, 42 anos, diz que a rádio sempre esteve presente no dia-a-dia dela e a ajuda muito no momento de distração, "Assim que acordo sintonizo a rádio porque preciso de uma companhia para arrumar a casa e quando me dou conta, só volto a desligar no fim da tarde", declara Dona Marilda e completa, "O que gosto na rádio é que os apresentadores falam sempre de tudo, desde culinária à saúde, e isso é essencial para uma dona de casa que nem eu". Já o espectador e estudante, Thiago Melo, 17 anos, ouve a rádio assim que pega a condução para ir para o colégio, e quando está voltando, e afirma que as programações são sempre muito envolventes e o estilo bem variado, o que quebra um pouco da visão conservadora que as pessoas têm de uma rádio comunitária, "Gosto da rádio porque os apresentadores falam diretamente pra comunidade e nos dá a oportunidade de participar como quisermos", afirma o estudante.


Sem fins lucrativos e mesmo com os recursos escassos que à principio possuía, a rádio Favela FM foi se instituindo e conquistando, não só o Aglomerado, mas toda a região metropolitana de Belo Horizonte.

Embora a resistência da rádio ainda seja maior na comunidade, a rádio se estabeleceu e mudou os conceitos de uma sociedade, a partir de uma história de repressão, muita luta, mas grandes vitórias. O alvará de funcionamento da Favela FM fornecido pela Prefeitura de Belo Horizonte chegou em 1996 e, a partir dessa data a rádio entrou nas leis, fortaleceu seu caráter comunitário e se instituiu como uma entidade cultural, falando do alto do morro, para mais de 160 mil pessoas.


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