quinta-feira, 22 de setembro de 2011

Sobre ética, moral e princípios – O jornalista e suas fonte

Por Roberta Terra

Em meio ao turbilhão de acontecimentos que moldam o mundo, sejam eles noticiosos ou não, temos a ética como um preceito fundamental à nossas ações do dia-a-dia. Por estar sempre presente em nossas vivências, acreditamos que ela seja a resposta de nossos princípios, ações e de nosso caráter.

A ética nos é, portanto, inerente. Mais ainda aos que se fazem jornalistas. Aqui, ela se torna duplamente necessária, pois se presta ao homem e ao profissional, sempre interessado em buscar a verdade. Mas, em meio a essa busca, encontramos obstáculos e é a forma com a qual lidamos com eles que nos permitem ter ou não ética.

Partindo do jornalismo e de sua relação com a ética – margem para discussões deste blog – observemos diferentes situações jornalísticas, e não menos pessoais.

Alguns casos sobre fontes

Muito se discute sobre as táticas exercidas pelos jornalistas, para com suas fontes, em busca de um fato. A palavra “fonte” já nos diz. Nós, jornalistas, “sugamos” todas as suas informações e nos sentimos “saciados” com tamanha façanha. Mas até onde vai nossa sede?

Pois bem! Comecemos com Truman Capote. Ao publicar A Sangue Frio, o célebre autor trouxe a tona um clássico do livro reportagem, mas também abriu margem para a discussão da ética.

Capote manteve, durante um ano e meio, uma relação um tanto quanto ambígua – e ainda hoje duvidosa – com uma de suas fontes, um dos assassinos da família Clutter, Perry Smith. Este só conseguiu revelar o desfecho do assassinato, quando sentiu-se extremamente íntimo e confiante de Truman. Já o autor, aproveitando-se da personalidade disfuncional de sua fonte, conseguiu tirar dela não apenas seu interesse maior, o fato em si, mas também um denso perfil psicológico e emocional.

Truman, por muitas vezes, deixou de lado princípios e moral na busca incessante da verdade. Desafiou as leis humanas ao utilizar apenas a memória como dispositivo de captação da informação. Entrou para a história ao criar, sem saber, o gênero literário: romance não-ficção.

Outro exemplo é o jornalista investigativo Caco Barcellos, escritor de memoráveis histórias sobre violência e injustiça social, que culminaram em dois livros reportagens: Rota 66 – A história da polícia que mata (1993) e O Abusado – O dono do Morro Dona Marta (2003).

Em O Abusado, chegou a visitar o ‘protagonista’ de sua obra, Marcinho VP, na prisão, em busca dos melhores relatos sobre a favela Santa Marta, no bairro do Botafogo, no Rio de Janeiro. Essa estreita relação com um dos traficantes mais procurados do país rendeu-lhe além do livro, o prêmio Jabuti.

Marcinho VP, que não era nem um pouco tímido e um tanto quanto inteligente, já havia se estreitado com o rico cineasta João Moreira Salles, cedendo horas de entrevista que resultaram no documentário Notícias de Uma Guerra Particular. O traficante, soube, tanto quanto seus interessados, tirar proveito das trocas de informação e conseguiu com isso chamar a atenção da imprensa para os problemas de sua comunidade.

Essa é uma história de conquistas e de sorte, o vínculo criado entre jornalista e fonte foi proveitoso para ambas as partes e a ética esteve presente nessa troca de relações. Marcinho VP nunca foi uma fonte em off, provando que confiança e lealdade são essenciais para essa prática.

Menos afortunado é o caso de um jornalista que sofreu abusos de milícias no Rio de Janeiro. Na matéria, publicada na edição 59 da revista Piauí, lia-se o seguinte lead “Eu era fotógrafo de O Dia, em 2008, quando fui morar numa favela para fazer uma reportagem sobre as milícias. Fui descoberto, torturado e humilhado. Perdi minha mulher, meus filhos, os amigos, a casa, o Rio, o sol, a praia, o futebol, tudo.” (Confira na íntegra). A história deste jornalista, que não quis se identificar, não foi muito diferente da de Caco, mas o final sim. Porque? Seria a ética responsável por essa desavença, ou foi a sorte mesmo?

O que amargou a vida deste jornalista resultou da maneira como lidou com suas fontes. Por se tratar de um ato ilícito, a matéria teve que ser feita com escutas, identidades falsas e fotos tiradas escondidas. O papel deste jornalista era investigar as milícias, trazer à redação verdades sobre o fato, mas a forma como ele se dispôs a fazer isso é que definiram seu trágico desfecho.

Nos Princípios Editoriais das Organizações Globo, publicado a alguns meses, na sessão que trata sobre a relação do jornalista para com as fontes, chamou-me atenção uma frase, “A lealdado do jornalista é com a notícia”. Bom, vista sob contexto, a frase é um pouco menos penosa de como exposta acima. Mas mesmo assim, não nos deixa dúvidas das relações imorais com as quais alguns veículos lidam com suas fontes em busca de furos, sensacionalismo e ‘verdades’ – lembram-se do caso Murdoch e das atitudes antiéticas trazidas pelo jornal britânico, “News of the World”?

A não prática da ética pode culminar não apenas no fechamento de um dos tablóides mais antigos do mundo, mas também em situações irreversíveis para o ser humano. Devemos, antes mesmo de pensar na ética jornalista, pensar em nossa própria ética, em como a estamos praticando e entender que moral e princípios são fundamentais para o desenvolvimento do cidadão do mundo.

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